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quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Presidente se assustou com crise por 'falta de contato com a sociedade', diz ministro do TCU


ABr
Ministro Augusto Nardes é relator do processo do TCU que analisa contas de Dilma Rouseff

No dia em que o Tribunal de Contas da União (TCU) decide se aceita a solicitação do governo federal por mais 15 dias de prazo para dar explicações sobre as contas públicas, o relator do processo, o ministro Augusto Nardes, disse, em entrevista à BBC Brasil, ser contra a extensão, além de apontar a "falta de contato com a sociedade" como um dos problemas que levou ao agravamento da crise do governo da presidente Dilma Rousseff.
Para Nardes, o prazo dado pelo TCU para o recebimento de maiores esclarecimentos, que vence na próxima quinta-feira (27), já seria suficiente. "Eu em princípio sou contra aumentar o prazo, mas vou consultar os demais ministros. Tenho um papel preponderante nesta questão, porque é uma decisão do relator, mas por ser uma decisão muito importante, eu tenho procurado sempre dividir com os ministros", disse.
Os esclarecimentos dizem respeito a novas irregularidades nas contas do governo referentes ao ano de 2014, e incluem as chamadas "pedaladas fiscais", manobras contábeis que envolveriam o uso de recursos de bancos federais para maquiar o orçamento federal.
O governo já entregou uma parte da defesa, mas, no último dia 12 de agosto, o TCU solicitou novas explicações. Além das pedaladas, o órgão preocupa-se com o fato de as supostas irregularidades terem ocorrido num ano eleitoral, e aponta para a demora do governo em tomar medidas de contingência da crise – algo sobre o qual o tribunal teria lançado alertas, diz Nardes.
Questionado sobre as declarações da presidente a jornais na terça-feira, quando disse que o governo tomou um "susto" e que não esperava uma crise com tamanha gravidade, o que ajudaria a explicar a demora em adotar medidas de contingência, como redução de gastos e ajustes fiscais, Nardes atribuiu a "surpresa" de Dilma a uma "falta de contato com a sociedade".

O parecer do TCU sobre as contas do governo federal referentes ao ano de 2014 é aguardado com expectativa, já que uma eventual reprovação pode servir de argumento para um pedido de impeachment da presidente. Indagado sobre pressões e o impacto da decisão em meio à crise política, o ministro disse que cabe ao Congresso entrar neste mérito.
"As nações fracassam quando as instituições deixam de cumprir a sua função. E a minha função é cuidar das contas junto com os auditores do tribunal. Eu me restrinjo a fazer o meu trabalho. Quanto ao procedimento de impeachment, não cabe a mim discutir isso, mas sim ao Congresso Nacional", avaliou.
Veja os principais trechos da entrevista:
BBC Brasil – O governo federal pediu mais 15 dias de prazo para apresentar explicações adicionais ao TCU sobre supostas irregularidades nas contas públicas. Como os ministros devem se posicionar?
Ministro Augusto Nardes – Eu estou examinando a solicitação, e devo tomar uma decisão junto com os ministros, que deve ser anunciada nesta quarta-feira. Eu em princípio sou contra aumentar o prazo, mas vou consultar os demais ministros. Tenho um papel preponderante nesta questão, porque é uma decisão do relator, mas por ser uma decisão muito importante, eu tenho procurado sempre dividir com os ministros.
BBC Brasil – O senhor se disse pessoalmente contrário à solicitação de aumentar o prazo para o governo dar explicações sobre as contas públicas. Na sua visão, já houve tempo suficiente para elaborar os esclarecimentos?
Nardes – No total já se somam 64 dias (desde o primeiro prazo e a primeira extensão) e tem toda uma questão de rito que tem que ser feita no tribunal, da equipe técnica. Como é um processo que envolve a presidente da República e as contas da República, eu acho que é importante a gente ouvir os demais ministros sobre esta decisão.
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Image captionGoverno da presidente Dilma Rousseff passa por crise política e de baixa popularidade
BBC Brasil – Sabe-se que as pedaladas configuram manobras fiscais que também foram usadas por outros governos, até estaduais e municipais, mas em avaliações passadas o TCU optou pela "aprovação com ressalvas", orientando a uma melhoria de procedimentos nas contas públicas. Agora, a que se deve esse maior escrutínio, bem mais rigoroso?
Nardes – Não se trata da mesma situação. O que fica evidente é que os valores de 2014 são bastante robustos. Além disso o tribunal está em permanente evolução, e a jurisprudência também. Nós fizemos um treinamento dos nossos auditores da área financeira, e muitas coisas que nós não conseguimos enxergar lá atrás, hoje estamos enxergando com muito mais clareza. Houve a evolução do tribunal e as informações que eu tenho em relação à situação anterior são de que já haviam sido feitos alguns alertas.
Eu mesmo alertei a presidente no ano passado sobre R$ 2,3 trilhões que não estavam contabilizados, da chamada previdência atuarial, que ela passou a contabilizar. Contabilizou uma parte no ano passado e eu já registrei isso nas contas deste ano. O tribunal já vinha alertando sobre essas situações, mas o que ocorreu é que em 2014 os valores foram bastante robustos.
BBC Brasil – Se as chamadas "pedaladas fiscais" ocorrem há anos em diversos governos, o TCU não estaria enviando a mensagem de que se um crime for cometido com menor intensidade, será aceitável, mas se o volume aumentar, será punido? Não há um problema de critérios?
Nardes – A questão é que o tribunal faz alertas e o tribunal já vinha fazendo alertas. Eu não era o relator, eram outros ministros, então eu não posso falar por eles. Minha decisão, no entanto, é de que estamos diante de uma situação diferente em 2014 porque há haviam sido feitos alertas e não foram tomadas providências.
BBC Brasil – O TCU fez alertas específicos sobre as "pedaladas fiscais"?
Nardes – Aí teria que fazer uma análise lá atrás, eu não posso confirmar. Mas eu, como relator, e considerando que cada ministro é independente, entendi que tinha que fazer um contraditório para evitar que aconteça no Brasil o que aconteceu com a Grécia, Espanha e Portugal, de cortar 50% dos salários, por exemplo. O meu dever como magistrado neste caso é fazer o alerta, para que sejam tomadas as providências, para que nós não passemos o vexame pelo qual está passando a Grécia, até porque não temos a Europa para socorrer a gente.
BBC Brasil – Um dos argumentos que o governo tem usado para explicar as "pedaladas" é a comparação com o cheque especial, alegando que os recursos dos bancos públicos teriam sido usados por muito pouco tempo, que se referiam a contratos já fixados, e não configurariam empréstimos. Quanto a isso, qual é o entendimento do TCU?
Nardes – Em alguns casos o dinheiro dos bancos públicos foi utilizado por três ou quatro meses. Eles estão nos respondendo sobre isso, mas somando o total de tempo utilizado chega próximo de anos. Não posso entrar muito neste mérito porque é justamente o que está sob análise neste momento.
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Image captionPresidente Dilma Rousseff participa de cerimônia de entrega de casas populares
BBC Brasil – O processo de análise das contas do governo e das pedaladas fiscais acabou tomando grande relevância no país e é sem dúvida uma decisão aguardada por toda a população. Há pressão sobre o senhor, como relator, e sobre os outros ministros?
Nardes – Isso faz parte do jogo democrático. O país é uma democracia e a pressão contra ou a favor é parte desses pilares importantes para a democracia brasileira. Eu não me assusto com isso. Fico tranquilo, e estou tentando conduzir da forma mais equilibrada possível, dando todo e amplo direito de defesa para o governo, ouvindo todo o governo, para que a gente possa conduzir de forma harmônica essa questão.
Eu mesmo recebi 13 mil e-mails até agora, de diversas origens. Muito mais a favor do TCU do que contra. Eu diria que 85% são favoráveis ao trabalho que o TCU está fazendo. Nós estamos mudando uma história de 80 anos que sempre optava pela aprovação com ressalva.
BBC Brasil – O TCU analisa as contas do governo em meio a uma grave crise política. Como é coordenar este trabalho ciente de que os resultados podem ter papel crucial num eventual processo de impeachment contra a presidente?
Nardes – Esta análise eu não faço, porque não cabe a mim este procedimento, cabe ao Congresso Nacional. As nações fracassam quando as instituições deixam de cumprir a sua função. E a minha função é cuidar das contas junto com os auditores do tribunal. Eu me restrinjo a fazer o meu trabalho. Quanto ao procedimento de impeachment, não cabe a mim discutir isso, mas sim ao Congresso Nacional.
BBC Brasil – Na opinião do senhor, a falta de contingenciamento, ou seja, de reduzir gastos e executar medidas de ajustes, foi tão grave quanto as pedaladas?
Nardes – Mais grave.
BBC Brasil – Como o senhor recebeu as declarações da presidente Dilma Rousseff a jornais nesta terça-feira, quando disse que a gravidade da crise foi "um susto" para o governo e que por isso teria havido a demora em executar medidas de contingência?
Nardes – É falta de contato com a sociedade, porque eu já venho falando há dois anos, alertando sobre essa questão da Petrobras há sete, oito anos, sobre o que estava acontecendo na empresa. Mostramos nas nossas auditorias, o Congresso foi avisado, recomendamos ao Congresso que não repassasse mais verbas para a refinaria Abreu e Lima, e o ex-presidente Lula (Luiz Inácio Lula da Silva) vetou, liberando as verbas, e ocorreu todo esse escândalo da operação lava jato. Se tivessem escutado o TCU sete anos atrás, muito do que está ocorrendo poderia ter sido evitado. Nós fizemos a nossa parte.
BBC Brasil – Os alertas do TCU poderiam ter evitado ou ao menos reduzido os estragos causados pelas irregularidades deflagradas na Operação Lava Jato?
Nardes – A Polícia Federal até já declarou que se baseou nas auditorias do TCU para fazer a operação. A questão é que nós não temos poder de investigação. Nós fazemos uma auditoria e a Polícia Federal é quem investiga. A Polícia Federal comprovou aquilo que nós tínhamos apurado e sobre o qual já tínhamos avisado o governo há muito tempo.
BBC Brasil – E daqui para frente, qual deve ser o papel do TCU? O tribunal deve sair fortalecido desse processo?
Nardes – Eu acho que é como antes e depois de Cristo, o antes e depois das contas. A partir de agora os gestores terão que ter um cuidado muito grande, porque há uma mudança de comportamento e isso faz parte de uma trajetória que nós estabelecemos, transformando o tribunal. Nós temos especialistas em mais de 50 áreas. Temos especialistas em todas as áreas. Eu quando fui presidente propus essa especialização de auditores em setores de saúde, transporte, energia nuclear.

FONTE: BBC

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