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sexta-feira, 11 de maio de 2012

AS MOEDAS DA FAZENDA BOM SUCCESSO


as moedas da fazenda bom successo

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AS MOEDAS
DA FAZENDA BOM SUCCESSO

A serra
A história destas moedas se passa em uma serra majestosa: a que chamamos de Baturité. Serras que completam e contrastam com o sertão mundo afora. 
Como sabemos o sertão resseca as entranhas do nordeste, mas, aqui acolá, faz uma pausa na sua aridez, então, surge uma serra, um serrote, aí, uma fresca se faz presente. O advento das grandes represas, dos açudes, é um fato novíssimo. O refrigério dos homens e dos bichos era mesmo nas serras úmidas ou precariamente em algum poço d’água persistente no leito de um rio ou riacho. As serras são como uns oásis.
A palavra Baturité é de origem indígena e tem o sugestivo significado de “serra verdadeira” ou “serra importante”, topônimo adquirido pela sua amplidão e imponência quando comparada a outras serras do Ceará ou do Nordeste. Podemos mesmo imaginar os índios, em priscas eras, sertão afora, vendo de longe a silhueta da nossa serra ao horizonte dizer: ibityra ete! Ou seja, aquela sim, é que é uma serra de verdade! E cometemos mesmo uma redundância quando falamos serra de Baturité, o certo seria dizermos simplesmente Baturité ao nos referirmos a serra que tem a cidade de Baturité encravada em um de seus contrafortes ao nascente.
Baturité, não sendo prolixo, é um maciço (conjunto de montanhas grupadas em volta de um ponto culminante) situado na região Centro-Norte do Ceará. Contrasta por seu clima brando e abundância d’água com o sertão ao redor, quente e seco — influência da altitude e de certa proximidade do litoral. Esse micro clima, favorável à cultura do café e outras culturas que exigem clima mais ameno, como a cana de açúcar, as fruteiras, as hortaliças, proporcionou à serra no século XIX e início do século XX um período de prosperidade econômica e de desenvolvimento social e cultural.
Baturité nesta época — a das moedas — tinha ainda o viço da juventude, suas póvoas, seu povo, resplandeciam. A terra era boa e o clima vantajoso.
A cidade de Baturité, sua principal comuna, bem ao pé da serra, com a chegada da estrada de ferro, era o maior entreposto comercial. Chegar até a “Vila dos Índios” era como chegar à serra sem precisar enfrentar suas penosas ladeiras de alto a pique. 
A vila de Guaramiranga talvez seja o lugar onde a serra é mais verdadeira, a temperatura é branda, bem na cumeeira, um clima verdadeiramente “medicinal”. O contraste com o sertão é bem evidente. Antigamente chamada Conceição herda o novo nome do galhardo sitio que a abraça. O sítio Guaramiranga, hoje pertencente à maior patente de serra, o galante Major Hugo a quem peço a bênção e presto continência.
A propósito, a palavra Guaramiranga tem suas sutilezas... Muitos querem que signifique “pássaro vermelho”, o que não corresponde à realidade. Vejamos. Guaramiranga, que é uma palavra indígena, é composta por duas outras palavras: guara e miranga. As palavras pitanga, piranga ou miranga têm o mesmo sentido e quer dizer vermelho. Já guara pode ter muitas traduções: pode ser passarinho (substantivo comum), pode ser uma arvore chamada Guará (substantivo próprio), pode ser o pássaro chamado Guará (substantivo próprio), pode ser um mamífero chamado Guará (canídeo) e também pode ser barreiro ou a barreira (lugar de se coletar barro, olaria). Quem conhece a serra sabe que em suas matas não existe nenhum pássaro vermelho, nenhum Guará, nem o pássaro , nem o cachorro selvagem e nem a árvore. Agora quem conhece a serra sabe que na Guaramiranga e no sitio Guaramiranga, tem pontos de terra vermelha que contrastam com os terrenos ariscados (brancos) ao seu redor. Portanto a nossa Guaramiranga quer dizer indubitavelmente barreira vermelha, lugar de terra vermelha, olaria de terra vermelha. Em épocas onde as panelas e outros utensílios tinham que ser de barro queimado, sem outra opção, a importância de um bom barreiro era máxima. Preconizo mesmo que a tratemos como uma bela dama, como faço ― a barreira vermelha. Com certeza, era ali em alguma barreira que os índios a ragião coletavam barro para fazer suas panelas, seus potes e suas quartinhas. E quanto aos empedernidos defensores do pássaro vermelho, recomendaria uma saída engenhosa e honesta: por que não imaginar um lendário pássaro vermelho encantado na matas da Guaramiranga etc. e tal... (Recomendaria a leitura dos bons tupinólogos principalmente Silveira Bueno)
Pacoti era como se fosse o lugar-tenente da cidade de Baturité. Entreposto emergente, de povo laborioso e progressista, em vários momentos é elevada ou rebaixada em sua hierarquia com relação à comuna de Baturité. Antigamente era o sitio Pendência, de uns meus avoengos da família Pimenta que ainda hoje estão na serra. Efetiva-se política e economicamente ao raiar o século XX após herdar o nome do rio que a anima, o Rio das Bananeiras. 
As vilas de Palmácea e Aratuba (antigas Palmeiras e Coité), e Mulungu sob influencia administrativa ora de Maranguape, ora de Pacoti, ora de Baturité, firmavam-se. Seus maiores entraves eram as dificuldades de transportes para escoar suas safras de rapadura, de cereais, de frutas, de café, mas, respondiam com um desenvolvimento percebível.
E os sítios? Que beleza...
O sítio Bom Successo, entre Pacoti e Guaramiranga, do coronel Figueiredo, o nosso velho Manoel — protagonista desta história― era com certeza dos mais desenvolvidos da serra. É um sitio muito bem localizado, bem nas nascentes do Riacho Aracoiaba, hoje terras da Guaramiranga com bastante água corrente que movia um dos principais rodeiros da serra. Era um centro agrícola e comercial naquele regime ainda patriarcal.
O sítio Guaramiranga do coronel Chichiu é o sitio que dá nome a vila. Essencialmente produzia café. Devido a proximidade com vila e a sensibilidade política e humanitária da sucessão de seus donos têm seus destinos unificados. Hoje tudo são flores. 
O sítio Uruguaiana era do coronel Dadá e da dona Libanea, o coronel, por morrer ainda novo, deixou o maior reinado para a viúva. E que reino! Das varandas do Uruguaiana eram comandados muitos sítios e fazendas, léguas e léguas de terra, até no Piauí. 
O sítio São Luís, do coronel João Pereira Castelo Branco, posteriormente dos Boris e depois de minha família, com sua roda d’água, combinando café e cana, produzia um moca e um mascavo de primeira. E sua cinematográfica casa-grande com seu alpendre arqueado é com certeza um dos clímaces de uma suposta arquitetura serrana. 
O sítio Pau d’Alho, junto a Pacoti, do coronel Epifânio Ferreira Lima, posteriormente do coronel Aprígio Alves Barreira Cravo e depois do coronel José Marinho de Góes, também com sua roda d’água e belos baixios de cana. O palacete do Pau d’Alho seria outra referencia da arquitetura serrana. 
Dizia-se mesmo assim, coronel praqui, coronel pracolá, assim eram conhecidos, assim eram cumprimentados, assim eram amados, assim eram odiados. Imperavam àquela época. Sob o manto de Gilberto Freyre eu dia que se vivia um regime patriarcal e agrícola muito embora tardio e claro. Tardio, pois a serra foi domesticada mesmo já no século XIX e claro pela escassez de negros.
E a gente de Baturité, por estes tempos, se compararmos com o resto do Estado, tinha boas oportunidades econômicas e sociais.
O motor das atividades na serra era, e ainda é, o amanhar a terra e plantar o “de comer”. A serra não se presta à pecuária, apascentar o gado no sertão, bem próximo, é bem mais salubre. Na verdade, àquela época, buscava-se mesmo a serra nos anos mais escassos de chuvas, o sertão era normalmente mais dócil, ou então, demorava-se na serra durante o “verão”, enquanto as chuvas não chegavam para descer ao sertão, o que se tornou um modus vivendi para aquelas pessoas. Ainda vivi a vida assim, da fazenda ao sítio, do Alto Alegre ao São Luis, de Campos Belos à Pacoti, do sertão à serra. E quando chovia, do sítio para a fazenda. E começar tudo de novo.
Uma curiosidade. O Dr. Luiz Sampaio, meu avô, chegou a ser prefeito de Pacoti algumas vezes. Em todas as eleições que participou sempre foi candidato único! Não tinha concorrente! E no acordo entre todos os partidos políticos para fazê-lo prefeito ele ainda fazia as suas exigências. Uma delas era que se desse maioria do votos ao candidato a vereador Alarico Ribeiro Guimarães que como o mais votado seria naturalmente o presidente da câmara de vereadores. Não existia vice-prefeito àquela época, o presidente da câmara era o substituto natural do prefeito. Tudo isto porque o Dr. Luiz já deixava bem claro antes da eleição que só seria prefeito no “verão”, no “inverno” seu lugar era no sertão. Dito e feito, quando chovia o seu Alarico tomava conta da prefeitura em sua plenitude e prestavam contas mensalmente. Todos estes acordos eram patrocinados pelo maior líder político da serra de todos os tempos, meu padrinho e também padrinho de meu pai, Francisco Alves Linhares Filho, o venerado Dr. Xico Linhares. E tudo dava bem direitinho no final. E mais curioso ainda: Dr. Luiz e Alarico eram adversários políticos! Imaginem se fosse hoje... 

O café 
O café (Coffea arábica), na nossa serra, entra em cena nos meados do século XIX. 
A cultura do café na serra, nos seus primórdios, ao contrário do que aconteceu no centro e sul do Brasil, no geral, não estava nas mãos dos ricos nem dos grandes proprietários, até mesmo porque ricos e grandes na serra eram poucos. Boa parte da produção cafeeira da serra provinha das plantações de pequenos proprietários, ou melhor, de parceiros ou agregados que faziam seus roçados de café em propriedades rurais o mais das vezes pertencentes a terceiros. Alguns donos de sítio, com o passar do tempo, para regularizar suas terras, tiveram que comprar cafeeiros plantados em suas próprias terras. 
Quando falo que ricos e grandes na serra eram poucos, sei que espanto a muitos “românticos”. Vejamos. Em 1889 o conde d’Eu em viagem de reconhecimento à serra, após uma visita ao sitio Pau d’Alho em Pacoti, foi jantar e dormir no sitio Cafundó, hoje Venezuela, terra da família Caracas. Sitio tão importante que foi escolhido para o príncipe jantar, tomar seu chocolate e pernoitar. Mas o que fazer para o príncipe tomar seu banho de ducha? Não havia ducha! A solução foi improvisar um serviçal sobre um andaime a jogar água sobre o príncipe.
Não havia ducha e não havia muitos confortos. A vida era dura! Trabalho e muito trabalho. Moagens começando uma ou duas horas da manhã, trabalho no eito de sol a sol, e, sempre, como regra, com a participação física do dono do sítio. A serra nunca foi uma Califórnia! Mas, lógico, para apaziguar os ufanistas, e confirmar a regra, haviam exceções. 
E quanto aos cafezais, são muitos os roçados de café nos sítios da serra com nomes de pessoas, com certeza, os antigos donos, ou então, os que implantaram os ditos roçados. Pois existe este hábito na serra: dar nome aos roçados de café.
Por exemplo, no sítio São Luis, entre nomes como Olho d’Água, Purgatório, Santo Antônio, temos Antônio Anjo, José Amaro, Casciano (sic), todos nomes de roçados de café. Tenho ainda vetustas escrituras que rezam assim: “um roçado de café...”, outras vezes, “um roçado de maniçoba...”. Tanto outorgadas por quem se dizia “senhor e possuidor” da terra, como por quem se dizia dono apenas dos cafeeiros ou das maniçobas. São as escrituras do coronel João Pereira, homem que fez o sítio São Luis na última metade do século XIX, como quem monta um quebra-cabeça, comprando terras, casas, roçados de café, roçados de maniçobas. Comprando também pés de café e pés de maniçoba! 
Os roçados de café eram implantados da seguinte maneira: derrubava-se a mata, procedia-se a queima e plantava-se milho, feijão ou fava, mandioca e café; prosseguindo-se roçando anualmente o café como cultura permanente. O café era cultivado na serra como o algodão arbóreo (algodão mocó) era cultivado no sertão. Era a cultura permanente que persistia nestes roçados após as culturas temporárias( o milho, o feijão e a mandioca) frutificarem. Este seria o modelo agronômico mais praticado, com poucas variantes. As vezes plantava-se a carrapateira (Ricinus communis) para fazer sombra ao café nos primeiros anos. Carrapateira é a mesma mamona em moda atualmente para a produção de biodiesel.
A mata era derrubada e aproveitava-se para a carpintaria e para as construções apenas os toros mais fáceis de serem transportados. O resto da madeira derrubada era queimada no local da broca. A terra ficava desnuda! A fertilidade da terra, representada por esta madeira, pela ação do fogo, era posta na superfície: a cinza. Sim, a cinza é um bom fertilizante. Mas logo vinha o vento e a chuva carregando tudo de alto acima ou de alto abaixo ficando pouco daquela cinza para fertilizar o solo. Mesmo assim nos primeiros momentos a terra ainda era forte e fertilizada por aquele resto de cinzas cumpria bem o seu papel produtivo. Tudo bem até a chegada precoce do estorvo da erosão.
Este cafezal produzindo a céu aberto tinha altas produções nos primeiríssimos anos, mas, logo definhava por causa destas práticas. A terra é íngreme e rasa, a rocha quase que aflora. O impacto ambiental provocado pela derruba e pela queima da mata no primeiro instante e a erosão inevitável, decretavam vida breve a estes cafezais.
O advento do café sombreado como hoje ainda vemos na serra é uma solução recente. A introdução da ingazeira e do camunzé para fazer sombra ao cafezal, minimizando as intempéries, mantendo a umidade e fertilizando o solo, dando-lhe vida mais longa, é prática que se generaliza somente no início do século XX. Sabemos que estas e outras leguminosas, tanto fixam nitrogênio do ar para o solo como retiram nutrientes outros das camadas mais profundas do solo para pô-los à superfície. São as folhas que caem e se transformam em humos. Digo mesmo que as ingazeiras são como o manto de Nossa Senhora a proteger os cafezais e a serra.
E o cafezal sob o manto verde das ingazeiras é quase eterno! Existem muitos cafezais centenários em nossa serra! Por sinal, a esmagadora maioria dos pés de café da nossa serra têm mais de 50 anos.
Mas, naqueles pioneiros cafezais moribundos, abandonados, improdutivos, nascia em profusão a maniçoba, uma produtora de borracha!
Mas antes, imaginemos um cafezal com todo viço, a céu aberto, em plena floração. Sintam o perfume e vejam o que o poeta Quintino Cunha vislumbrou — com certeza veraneando no palacete do sítio Pau d’Alho do seu amigo coronel José Marinho de Góes — a serra toda branca, tal qual uma virgem, de grinalda e véu...
Àquela época podia-se ver a serra assim, o cafezal não era sombreado como é hoje, os cafeeiros não ficavam amocambados por baixo das ingazeiras e dos camunzés e o branco e o perfume de suas flores ficavam totalmente revelados em uma florada. 
Mas, deixando de romantismo, o café, ao contrário de outras culturas, necessita de muitos “benefícios”, ou seja, de muitos tratos e cuidados, antes de cair chegar fumegante e cheiroso à xícara. A trabalhosa colheita, feita normalmente por mulheres e meninos nas escarpas da serra, a secagem sempre difícil, fugindo da chuva, em faxinas de terra batida, precediam a pilagem, passagem mais complexa deste processo. A pilagem, que é a descasca e uma rudimentar classificação dos grãos, era feita com extrema morosidade e trabalho principalmente por quem não tinha a maquinaria adequada. Estes, mormente, recorriam aos rodeiros: engenhos, movidos a tração animal, a maioria, a energia hidráulica ou motriz, os maiores, que se especializavam na pilagem do café. E a pilagem é um “ato obrigatório”, por padrão, somente se comercializa o café pilado.
A Fazenda Bom Successo, do nosso coronel das moedas, pelas suas boas condições hídricas — às nascentes do rio Aracoiaba — que viabilizavam um potente rodeiro, pela sua localização no centro da serra, pela operosidade e interesse de seu dono, passou a pilar grande parte do café da serra a partir das últimas décadas do século XIX. Mesmo assim, a maquinaria era morosa, a produção da serra crescia e a roda d’água que movia o rodeiro tinha que trabalhar muito e a “toda água” para dar conta de tanto café.
Destarte o Bom Successo era procurado por diversos tipos de fregueses: os que desejavam vender, comprar, as vezes apenas pilar o café. Eventualmente também queriam investir em café de uma safra ainda por ser colhida, o que se chama “comprar na flor” e todos tinham condição de sair satisfeitos da casa daquele grande comerciante que na verdade prestava um serviço àqueles agricultores e que incorporaria, como veremos, também as atividades de banqueiro aos seus negócios.
A máquina de pilar café, movida a força motriz, chegaria logo após a serra. 
A borracha
Sabemos que a borracha foi a mola mestra da economia amazônica espetacularmente no século XIX. Época de muita prosperidade econômica. Prosperidade esta que também respingava aqui pelo Nordeste. Porém, no início do século XX, além da concorrência de outros produtores mundo afora, também tivemos o advento da borracha sintética, o que fez com que a borracha vegetal perdesse muito do seu valor. Pois bem, no auge deste verdadeiro rio de dinheiro amazônico, século XIX, a nossa serra vem com uma novidade: a borracha da maniçoba!
Sim, aquela que nascia naturalmente nos cafezais baldios.
As maniçobas (Manihot sp.) são plantas nativas da própria serra. Têm uma característica marcante: crescem muito rápido e com suas folhas enormes “abafam” o que está ao seu redor, não deixando luz para as outras plantas, impedindo que elas tenham desenvolvimento normal e satisfatório. São típicas das matas secundárias, ou seja, de locais aonde a mata original já foi destruída. Produzem um látex (borracha) semelhante ao da seringueira que os serranos passaram a explorar. Nos roçados abandonados onde morria o café a maniçoba nascia em abundância, e assim, a serra conheceu um “ciclo da borracha” desconhecido de muitos nos dias de hoje.
E sim, teve razoável importância econômica a borracha extraída da maniçoba para a serra.
A possibilidade de se colher este látex semelhante ao da seringueira e ter uma pequena amazônia aqui no Ceará, fez crescer os olhos de muitos, inclusive do grande capital internacional. Tomemos o Banco de Londres e Boris Frères & Cia. Ltda., estes, comerciantes e capitalistas franceses, como exemplo.
Estas foram as primeiras investidas de instituições creditícias na serra, a farejar lucros fáceis com os olhos na borracha. Facilmente se tomava dinheiro emprestado para negócios com borracha com estas instituições, sempre, lógico, dando-lhes a terra como garantia. Com a crise da borracha surgem as dificuldades financeiras das pessoas envolvidas com sua extração aqui na serra e muitos sítios são perdidos pelos primitivos donos a favor desta coorte estrangeira. O Bank of London e os Boris (Boris Frères & Cia. Ltda.) passam a ser possuidores de muitos sítios na serra. Lembro-me do sitio Carmelino e do Boa Esperança, ambos próximos do São Luiz, adquiridos por Antonio Sales, o bom Caboclo Sales, aos ingleses.
Um dos maiores sítios da serra, o São Luís, já citado, adquirido por meu avô Luiz Cícero Sampaio aos Boris, foi pago quase na sua totalidade com borracha e couro de boi, gado este abatido para consumo no próprio sítio. Tudo no início do século XX, já em meio à crise econômica que aqui vai relatada. O coronel Zeca Sampaio, meu bisavô, havia arrendado o São Luiz aos Boris, com sua morte em 1922, o arrendamento do sitio passa naturalmente a meu avô Luiz. Muitos grandes da serra se apresentaram aos Boris para comprar o sitio. Um dos que mais insistiram foi o famoso coronel Chichiu. Mas os Boris foram firmes, a preferência era do Luiz por ser filho do Zeca.
O São Luis foi comprado por cento e oitenta contos de reis, em nove prestações anuais de vinte contos. Como o Dr. Luiz era muito precavido pagou sempre um ano antes do vencimento cada duplicata. Quando o doutor foi liquidar a última prestação em vez de pagar vinte pagou apenas seis contos! Os Boris creditavam ao Dr. Luiz os juros das prestações pagas adiantadamente. As transações entre os Boris e o Dr. Luis envolviam entre outras coisas mercadorias como borracha, couro do boi e café, conforme consta em velhos romaneios que ainda escondo das traças. Portanto não sei exatamente porque na escritura de compra do São Luiz pelo doutor consta apenas o valor de quarenta contos. 
Entremente, a seringueira, desde 1876, era levada da Amazônia para a Ásia. Máxime no início do século XX nossa borracha sofreu fortíssima concorrência dos produtores asiáticos e a depreciação foi enorme. A Ásia produzia uma borracha melhor e mais barata que a brasileira. O que dizer de uma borracha de inferior qualidade ainda como a de Baturité? Tudo isso sem falarmos da entrada no mercado da borracha sintetizada a partir do petróleo.
Os que se envolveram com borracha na nossa serra estavam em maus lençóis, e o nosso coronel Figueiredo era um deles.

O coronel Figueiredo 
Nesta serra em transição laborava o coronel Manoel José d´Oliveira Figueiredo — o homem das moedas.
Vivia na Fazenda Bom Successo, entre Pacoti e Guaramiranga, português, misto de agricultor e comerciante, danado, com certeza um empreendedor. Pai de muitos filhos, possuidor de algum dinheiro, dono de muitas terras, protagonista de muitas histórias... Um parêntesis: A rigor seria Sítio Bom Successo. Na serra nós temos sítios, no sertão temos fazendas. O sitio é de plantar, a fazenda é de criar. Gosto muito de uma definição que acho que tirei de minha cabeça mesmo: no sítio nós cercamos para criar; na fazenda nós cercamos para plantar. Digo fazenda, pois nas moedas está cunhado Fazenda!
Como agricultor tinha propriedades em Baturité, em Uruburetama, nos sertões do Quixadá e do Canindé, era do plantar e do criar. A cada fazenda, lavouras distintas, interesses vários, leitos diversos...
Como comerciante, informa-me o Prof. Vinícius Barros Leal, o verdadeiro conhecedor da história da serra, que o registro número um da junta comercial do Estado do Ceará é uma firma de torrar café na Guaramiranga de sua inspiração. Se juntarmos essa ousadia com a concepção destas moedas, não acredito em ninguém mais arrojado.
Deve ter, dentro do trabalho, usufruído do melhor da serra e do seu tempo... E era um jogador.
E a vida muda o jogo. Voltemos àqueles cafezais constituídos com fogo, naquelas escarpas íngremes de solo muito raso, a mercê da erosão, eles não tinham vida longa: morriam. A prática de sombreamento do cafezal com a ingazeira ainda não era uma técnica generalizada. Todavia, ali nascia a maniçoba, um negócio novo, borracha na serra! O nosso coronel, com sua operosidade, investe preferencialmente nessa nova atividade, até comprando novas terras, redobrando seu trabalho. Contraindo dívidas e canalizando seu capital para a nova atividade enfrenta os novos tempos e se impõe o empreendedor. E o jogo muda a vida.
Pensando no café, para dinamizar o seu mundo de negócios e acredito também para se capitalizar, teve uma idéia porque não dizer genial: criar uma moeda. Passava muito café pelo seu sitio, seu rodeiro trabalhava o ano todo, permanecia café de muitos produtores em seus armazéns.
As moedas teriam como referência o café e sua garantia pessoal. Circularia representando o café enquanto este não era pilado ou colhido. Facilitaria muito as transações comerciais, pois como sabemos a colheita do café é anual e o processo de pilagem não é feito com rapidez.
As moedas teriam três valores faciais: um alqueire (128 litros), uma quarta (32 litros) e uma terça (8 litros), tudo medido em “café em coco”, ou seja, café seco antes de ser pilado. Dito e feito. Quem o procurava para pilar café, entrava na fila da pilagem, deixava o café no Bom Successo e levava as moedas.
As moedas foram cunhadas em bronze com verso e reverso, talvez em Portugal, talvez na Bahia, todas com a data de 1895.
Passaram a circular em toda a serra e no sertão ao redor. Tiveram muita aceitação, o lastro era em café — que se valorizava a cada dia — e a garantia era de um homem muito conhecido, rico e de bem. Ainda não se tinha idéia de inflação e era mais fácil guardar moedas que sacos de café. E muito importante, facilitava em muito as transações comerciais. Também possuí-las seria mesmo uma poupança! Pela confrontação das datas devem ter tido uma vida útil, dentro da maneira que foram concebidas de uns 20 anos.
Mas, jogo feito! A borracha perde o seu valor e o coronel ganha dívidas e incertezas.
Correm boatos de sua fraqueza financeira e muitos o procuram para “trocar” as moedas por café e infelizmente já não existia café suficiente nos armazéns da Fazenda Bom Successo para lastrear as moedas. Os credores, possuidores de moedas, batem em profusão em sua porta e o coronel passa a honrar seus compromissos com dinheiro de outras fontes. 
Homem correto e probo como era o nosso coronel resolve juntar suas moedas para não ter seu nome sujo já que seus negócios fraquejavam cada vez mais. Tinha medo da posteridade. Toma então uma grave decisão: vender terras para se capitalizar e saldar suas dívidas, honrar e reaver as moedas que tinham seu nome. 
Após juntar as moedas, com certeza todas que lhe foram apresentadas, saldar os compromissos assumidos, mas já sem forças e de finanças bem corroídas, dirige-se ao amigo Aprígio Alves Barreira Cravo no sítio Pau d’Alho em Pacoti. Neste encontro presenciado por meu tio avô José Nepomuceno, o querido José Chicó, meu ídolo, que era administrador do Pau d’Alho à época, o velho Manoel apresenta e presenteia as moedas já sem valor ao amigo Aprígio, recorda-se de sua longa vida de luta, brama sua honra e volta ao Bom Successo.
Fora sua última parada, perdera o jogo. Em seguida põe fim a sua própria vida. Mata-se.
Dentre as várias versões para a morte do coronel Figueiredo, uma das mais fantasiosas é a de que teria colocado uma faca presa na dobradiça de uma porta da sala da casa do Bom Successo e jogara-se por cima tendo uma morte cruenta, instantânea.

As moedas 
Em 1923 o coronel Aprígio, que herdara as moedas, resolve vender o sítio Pau d’Alho, não morava mais no Ceará e o oferece ao Dr. Luis Cícero Sampaio, meu avô, filho do coronel Zeca Sampaio que era seu procurador na serra. O Dr. Luis não pode comprar o Pau d’Alho porque estava em negociação com os Boris comprando o sítio São Luis já citado. Então o coronel Aprígio resolve vende-lo ao coronel José Marinho de Góes, seu primo, pai de meu sogro, José Ellery Marinho de Góes, o venerável Zelito.
Mormente presenteia as louças e os talheres da casa grande do Pau d’Alho, o palacete que hospedara em 1889 o Conde d´Eu em viagem de passeio à serra — e as moedas —ao Dr. Luis Sampaio.
O coronel Zeca, meu bisavô, arrendara o sítio São Luís dos irmãos Boris em 1915, posteriormente meu avô Luís o compraria conforme já relatei. Quando o Dr. Luis, já casado, vem morar no São Luis, em 1924, traz para cá também os presentes que ganhara do coronel Aprígio. Tudo dentro de uns vetustos baús de couro, marcados com as letras A.A.B.C. que ainda hoje resistem a todas as injustiças do tempo nas despensas úmidas da casa grande do São Luis. As louças passaram a ser usadas cotidianamente e as moedas também!
Uma curiosidade: entre a frascaria vinda do Pau d’Alho para o São Luis veio uma escarradeira. Àquela época, cuspia-se muito! Era uma pratica recomendada pelos médicos, tempos de tísica. As casas ricas tinham obrigatoriamente suas escarradeiras. A do São Luis é linda! Toda em ágata, branca com desenhos em rosa e verde, no formato de um balde de uns 20 litros, com uma tampa como se fosse um funil invertido. E o mais curioso, a minha geração, eu também, as pessoas do sítio, não sabiam e não sabem o que é aquilo! Mas ela existe e deve viver ainda a enfeitar algum canto de sala, cheia de flores. Quando eu era menino ela já tinha umas úlceras de um lado que eram sistematicamente escondidas voltadas para a parede. Que tempo... 
E quanto as moedas? Aqui no São Luís, até a década de oitenta, nossas moedas serviram e militaram. Serviam de “fichas” para a contagem de balaios de café apanhados na época da colheita. Explicando: ao final de um dia de trabalho, cada apanhador, normalmente mulheres, recebia as fichas correspondentes aos balaios de café apanhados naquele dia — um uso já bem diverso da concepção original das moedas pelo velho Manoel. Ao final da semana era feito o pagamento do café apanhado pela contagem das fichas, ou seja, das moedas. Aqui no São Luis estas moedas serviram ao meu avô Dr. Luís, ao meu pai Onofre e a mim Francisco Luiz, três gerações. Curioso também é observar que neste novo mister as moedas eram usadas indistintamente como fichas. Ficaram sujas e gastas com o passar do tempo e também não se fazia diferença entre os valores de face de cada moeda. Todas eram iguais e também ninguém se interessava pelo seu formato nem suas inscrições. Qualquer uma representava um balaio de café. A totalidade das pessoas que as manuseavam não sabiam sua historia nem sua origem ou no mínimo não davam a menor importância a isso.
Em 1989 resolvi guardar estas moedas que encheram de fantasia minha meninice. Eu talvez fosse o único que tivesse curiosidade sobre elas.
Passei a investigá-las.
Minha amada avó Carmen, esposa do Dr. Luis e seu irmão José Chicó, o que presenciou o encontro entre o coronel Manoel Figueiredo e o coronel Aprígio, ambos ainda totalmente lúcidos, deram-me as luzes aqui expostas. Como vemos alguns fatos aconteceram totalmente dentro da nossa família e somente eles poderiam saber. Tive sorte.
Com outras pessoas ainda, como, este sim, o coronel “de verdade” Nestor de Matos Brito e de meu saudoso sogro Zelito, completei esta história ainda não completamente retocada, mas, que tem como personagens vivos as moedas em meu poder, além de documentos, fotos e objetos.
Em 1990 procurei pessoalmente a Sociedade Numismática Brasileira em São Paulo, doei umas moedas ao museu desta Sociedade, fiz camaradagem com os grandes colecionadores e escrevi com despretensão um primeiro artigo sobre as moedas e o divulguei no Boletim Notícias da Sociedade, número 21, de abril de 1991, com circulação mundial. Este Boletim é o informativo oficial da sociedade. Até aquela data as nossas moedas, embora raras, eram conhecidas e admiradas no mundo fascinante da numismática, o que ninguém conhecia era a sua história.
Em 1995, comemorando os cem anos das moedas, pois todas têm a data de 1895, pus em leilão, em São Paulo, na Sociedade, três moedas. Alcançaram um valor surpreendente, tanto que com o apurado comprei cinco moedas da antiguidade, inclusive uma de antes de Cristo.
A notícia das moedas chegou à Nova Iorque através da publicação da Sociedade, ao Sr. Alexandre de Barros, brasileiro, numismata, economista da ONU, que entrou em contato comigo por carta. O seu interesse pelas moedas nos levou a trocar farta correspondência e desta troca de idéias chegarmos a algumas evidências interessantes. O Alexandre, que não conheço pessoalmente, foi quem na verdade me orientou e chamou atenção para o valor especial destas moedas.
As moedas são originais e raras principalmente pela sua concepção, ou seja, as moedas particulares que circularam àquela época serviram para pagar mão de obra nas grandes fazendas — eram os conhecidos borós—, uma espécie de vale. Na verdade eram vales emitidos por um empregador a ser descontado junto a comerciantes específicos com posterior ressarcimento. Não tinham lastro e a garantia era apenas a honorabilidade do emissor. Nossas moedas não têm nada a ver com borós.
É até mesmo desconhecido, ou raro, o fato de moedas particulares com lastro em mercadoria com a possibilidade inclusive de capitalizar seu criador. Este é o it das moedas da Fazenda Bom Successo.
E quanto ao aspecto estético, realmente são muito bem cunhadas e bonitas, se compararmos às outras moedas particulares cunhadas no Brasil ou na América. Na verdade, a esmagadora maioria das moedas particulares catalogadas no Brasil e nas Américas são moedas oficiais com pequenas marcas que as modificavam o valor. São raras as moedas cunhadas especificamente para uso privado. 
O grande numismata Kurt Prober, em suas obras que já são clássicas, se referindo às moedas particulares, relaciona 278 carimbos aplicados sobre moedas oficiais que circularam no Brasil. São marcas feitas em moedas oficiais, normalmente de pequeno valor, lhes atribuindo um novo valor em espécie (dinheiro) ou gêneros (mercadorias). Tinham credibilidade e aceitação em uma área restrita e eram sistematicamente liquidadas, ou seja, o emissor da moeda estava sempre a reavê-las. Borós, na verdade. As únicas moedas particulares, explicando, cunhadas como tal, que Kurt Prober faz referência, são as três da Fazenda Bom Successo e uma da COMPANHIA NICHTEROI & INHOMERIM do Rio de Janeiro que circulavam nas barcas da Cantareira. Hoje sabemos que existem mais umas poucas moedas particulares genuínas, cunhadas especificamente como tal, mais as do velho Figueiredo são sem dúvida originalíssimas especialmente na sua concepção.
Como vemos estas moedas fizeram história, tiveram vida e têm um elevado valor por sua contribuição real ao progresso de Baturité e do Ceará. Capital que produziu trabalho e gerou riquezas. A elas podemos aplicar a frase do grande Hipócrates que segundo Flaubert deve ser citado sempre em latim, pois escrevia em grego: ARS LONGA VITA BREVIS, ou seja, a arte é longa a vida é breve. Em aproximadamente vinte anos de vida útil na concepção original elas se tornaram perenes, vivas para sempre.
Esta história
Posso dizer que a historia destas moedas ronda por dentro de mim. Existem fatos com relação a elas e ao seu criador que me intrigam. Há muito mistério em torno deles.
Minha família, meu avô, homem esclarecido, advogado brilhante, formado aos 22 anos, pois perdera 2 anos com um deslocamento de retina, meu pai, ninguém se interessou antes por elas. Elas existiam no São Luis, simplesmente como fixas. Nada mais. Quanto a mim, confesso, desde a primeira vez que as vi, fiquei deslumbrado e curioso.
Uma vez conversava com um amigo, Fernando Studart, no meio da rua, na praça São Sebastião em Fortaleza, quando um senhor olhou pra mim e disse: você é que o homem das moedas! Tomei um susto, quis negar, mas amistosamente entramos em conversação. Era conhecido de vista do Fernando, era dentista, aposentado, descendente do velho Manoel, queria me conhecer, falar das moedas e principalmente saber da historia de seu bisavô. Contei-lhe o que sabia. Ficou muito alegre, dei-lhe uma moeda de presente e nos despedimos. Ele não sabia praticamente nada sobre o bisavô!
Outra vez dirigindo um automóvel de Guaramiranga a Pacoti, em uma curva do caminho, quase me choco com outro automóvel. Quando paramos saiu um cidadão do outro carro e me disse que bom este quase acidente, eu venho de sua casa, nesta época morava em Pacoti, e não fora este incidente não nos encontraríamos! Era um bisneto do velho Manoel. Queria conhecer-me e saber de seu avoengo ilustre!
Um dia um amigo, Evando Holanda, insistiu tanto para que almoçasse com ele no clube dos advogados em Fortaleza, na Praça do Ferreira, que terminei aceitando. Quando chegamos ao restaurante só existia uma mesa com cadeira vazia, duas cadeiras, mas como todos eram advogados, conhecidos, nos dirigimos à mesa. Antes mesmo de nos sentarmos o cidadão já sentado olha pra mim e diz: estava louco para conhecê-lo, sou neto do velho Manoel! Queria saber o que eu sabia de seu avô, pois ele não sabia de nada. Pensei logo que era um encontro combinado com o Evando, mas não, meu amigo não teve nenhuma participação no encontro. Todo coincidência...
Fui a São Paulo para assistir uma exposição agropecuária. Era a primeira vez que ia ao sul do país. E quem está no aeroporto? Sim, um bisneto do velho Manoel a esperar-me. Fui apresentado ao rapaz, chamado Marcelo Farias Figueiredo, pelo Dr. Flavio Sabóia, que me aguardava. O Marcelo e seu pai queriam saber do velho Manoel. O ramo paulista da família Figueiredo vem de um filho do velho chamado Paulo que vai embora do Ceará logo após a morte do pai. Este Paulo é avô de um conhecido ator de telenovelas que tem o seu mesmo nome, Paulo Figueiredo.
Outros fatos semelhantes aconteceram comigo anos afora, o que tem me deixado espantado.
Um dia, no São Luis, meio de semana, à tarde, tarde fria, chegou uma senhora já bem idosa, com seu filho, queria conhecer-me e rever minha avó Carmen. Era a viúva de um neto do nosso velho que vinha de São Paulo com uma missão: Incentivar-me a pesquisar sobre a vida do velho. Já minha avó que estava cochilando quando a senhora chegou, do alto de seus 90 anos, não a reconheceu de pronto. E as duas velhas senhoras ficaram a se olhar com indiferença! Todo muito estranho. Mas, após um café e uma boa meia hora, dona Carmen se vira para a visitante e diz:
― Fulana, como vai você? Tudo bem? Anda passeando?
― Tudo bem Carmen, vim revê-la e conhecer seu neto que tem uma missão importante!
Trocaram palavras amáveis e após mais meia hora de prosa a senhora foi embora. Soube que pouco tempo depois morreria em Campinas, São Paulo, onde residia. Dizia que não queria morrer sem me conhecer e pedir algo!
E dona Carmen ao ser perguntada por que quase não a teria reconhecido de pronto, respondeu que estava tudo bem:
― Outro dia tinha ido a casa dela e até almoçado!
Achei que minha querida avó estava sofrendo mesmo o peso da idade... Ela vivia comigo e eu sabia que este encontro não havia acontecido. Ao insistir com dona Carmen ela confirmou:
― Estive lá sim, outro dia, com o Luiz.
Então entendi que este encontro havia sim ocorrido há 50 anos atrás quando meu avô doente da vista foi a Campinas acompanhado de minha avó para tratamento medico.
Não vou mais me alongar, contaria outro tanto de coincidências, mas pergunto, não é muita coincidência? Porque tantas pessoas, eu diria, saindo do nada vêm a mim em busca de noticias sobre o velho Manoel?
Todos os fatos mostram que o velho Manoel foi um grande homem, muitos negócios, muito dinheiro em certa época de sua vida, muitas propriedades, muitas mulheres, muitos filhos, talvez alguns escravos, era português, tinha a fala enrolada, valente, muitos interesses em muitos lugares. Tenho mesmo a impressão que sua vida não terminou ainda! O suicídio... Seus descendentes não se conhecem e existem muitas historias a seu respeito. A maioria delas a lhe denegrir. Acho que tenho ainda muito a descobrir para contar sobre ele.
Tenho mesmo a impressão que ele me escolheu para contar a sua verdadeira historia. Já que não deu tempo ele mesmo contá-la. Até já me pagou adiantado! Só sei que fico todo arrepiado... 
V 3.0
Fazenda Alto Alegre, janeiro de 2008.
Xico Luiz


FONTE: http://xicoluiz.blogspot.com.br/

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