Em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo neste domingo, 05, o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, deu demonstração de independência da instituição em relação ao governo e afirmou que as investigações da Operação Lava Jato irão continuar, com “o ministro José Eduardo Cardozo na Justiça ou não”.
Discreto e de poucas palavras, o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, saiu do quase anonimato e disse ao Estado que, mesmo que as investigações cheguem perto da presidente Dilma Rousseff, do ex-presidente Lula e de suas campanhas, isso não muda nada na Lava Jato e ninguém estará livre de ser investigado: “Nós investigamos fatos, não pessoas. Aonde os fatos vão chegar é consequência da investigação, doa a quem doer”.
Se o ministro deixar o cargo, a PF muda?
Se o ministro vai ou não ficar é uma questão que afeta ao Ministério da Justiça e a Presidência, não a PF. A PF é uma instituição sólida, seguirá sua vida com Cardozo ou sem Cardozo, com Daiello ou sem Daiello. Nós temos uma estrutura que se consolidou nos últimos anos, uma doutrina de polícia, de investigação, e uma cultura de polícia de Estado e de polícia legalista.
A direção do PT convocou o ministro para cobrar a atuação da PF, e o ex-presidente Lula diz nos bastidores que o ministro “não controla” a PF. Não controla mesmo?
A PF é controlada pela lei. Nós cumprimos a lei e ninguém vai aceitar ingerência política aqui. Pressionar o ministro da Justiça para influenciar, evitar, coibir qualquer ação da PF não é uma possibilidade. Pensar nesse sentido é premeditar o cometimento de um crime.
O ministro da Justiça não é seu chefe?
O ministro da Justiça é o responsável pela PF, mas na esfera administrativa. As ações da PF na esfera de investigação são feitas no limite da lei.
Então, o que tanto o senhor conversa com o ministro da Justiça? O senhor vive no ministério…
Assuntos correlatos à PF, fronteira, tráfico de drogas, equipamentos novos…
E investigação do PT, das campanhas da presidente?
O ministro tem conhecimento de uma investigação no dia em que a operação é desencadeada, logo após as buscas e prisões. O diretor-geral, nesse momento, informa ao ministro o que esta acontecendo, mas só nesse momento.
E se um ministro da Justiça pedisse para o diretor da PF “maneirar” nessas investigações de empreiteiro, de Lula, de Dilma, de petistas?
O diretor-geral da PF tem como prioridade o cumprimento da lei. Ele vai cumprir a lei e fazer as investigações que a lei determina e dentro do limite que a lei determina.
Isso já aconteceu?
Não. O ministro tem uma conduta totalmente republicana e é extremamente legalista, como o diretor-geral da PF também é.
Algum político procurou o senhor para mandar esse recado?
Não há espaço para isso. A história da PF e as ações da PF já deixam claro uma postura republicana e uma polícia de Estado.
O PT reclama que tudo é doação de campanha e que a oposição também recebe. Dilma citou o tucano Aécio Neves. Por que a PF só atinge praticamente o PT?
A PF não investiga pessoas, mas fatos. Se existem indícios de que um fato pode ser crime, a PF vai investigar dentro de suas atribuições, que são o desvio de recursos da União, contrabando e tráfico de drogas.
Do outro lado, tucanos reclamam que toda investigação contra petistas e aliados ao governo tem sempre um único tucano, para constar que vocês são isentos.
Vale o mesmo princípio. A PF preza por esclarecer os fatos, trazer a verdade ao processo. É essa a nossa missão, doa a quem doer. A PF só instaura procedimento investigatório se tem indício de existência de crime e, quando o personagem tem foro privilegiado, ou seja, mandato, a PF precisa de autorização do STF ou do STJ.
Se não há pressão política, há pressão do poder econômico, principalmente com o ineditismo de empreiteiros na cadeia?
A PF, por sua doutrina, é imune a qualquer tipo de pressão. Não nos interessa quem está sendo investigado, mas fazer uma investigação competente, com provas robustas.
Um agente da PF disse à CPI da Petrobrás que implantou duas escutas, na cela do Alberto Youssef e no fumódromo, a mando de delegados da Lava Jato.
Toda e qualquer conduta duvidosa é apurada de imediato pela Corregedoria. Estamos apurando se o fato existiu e se foi ilícito administrativo ou penal.
Uma escuta ilegal poderia anular a Lava Jato?
Não vislumbro nada nesse suposto fato que possa levar à nulidade da Lava Jato. A operação é muito bem construída, com robustez das provas, que segue seu trajeto dentro do padrão das operações da PF.
Até onde vai a Lava Jato?
Vai até exaurir. Enquanto encontrar fatos com indícios de serem criminosos, a PF continuará investigando. A Lava Jato começou com a investigação de quatro doleiros, se estendeu para seus clientes, novos inquéritos foram abertos e virou o que virou. E vamos continuar.
Mesmo que isso chegue perto de Dilma, do ex-presidente Lula e de campanhas de ambos?
Nós investigamos fatos, aonde os fatos vão chegar é consequência da investigação, doa a quem doer.
Se essa investigação chegar aos seus chefes e mexer com a institucionalidade do País, como o senhor lida com isso? Na parede da sua sala tem uma foto oficial da presidente da República.
Quando começa uma investigação você não sabe as pessoas que vão surgir. É preciso ter clareza de que não é dado o direito ao policial de não cumprir o que a lei determina. Não se trata de uma questão de escolha.
As brigas com o MPF atrapalham as investigações?
As divergências entre PF e MPF são antigas, admito que continuam existindo, mas temos obrigação com a sociedade brasileira de trabalhar em conjunto e assim é feito.
A PF tem uma grampolândia?
Os equipamentos podem ser auditados para saber quem usou, quando usou, no que usou. A PF não é uma grampolândia. Não chega a 1% o número de investigações com monitoramento telefônico. Na Acrônimo (que investiga o governador de Minas, Fernando Pimentel) não teve, por exemplo.
O governador disse que fará uma representação contra o vazamento de informações contra ele.
Qualquer representação será apurada com rigor pela Corregedoria, mas é preciso ter presente que as operações têm em média um ano na PF e não há vazamentos nesse período. Só que, quando cumpro prisão e busca, todas as pessoas alvos têm acesso aos dados e, aí, não tenho mais como controlar. No caso do governador Pimentel, o juiz determinou a entrega da sentença e, quando fui na busca, tive de entregar a sentença. Vou a 15, 16 lugares, e entrego a decisão. A partir dali, já não posso garantir nada. Antes disso, alguém sabia da operação?
O que é fundamental no combate ao crime organizado?
O foco é descapitalizar as organizações criminosas, porque, sem dinheiro, elas se enfraquecem e, asfixiadas, também não têm como corromper servidores e entes públicos. Por isso, várias operações que cresceram tanto começaram com a investigação de doleiros. É aí que está o dinheiro.
Há muitas críticas à prisão preventiva do Marcelo Odebrecht. Por que não temporária ou condução coercitiva?
Pedido de prisão não é unilateral, passa pelo parecer do MPF e pela decisão do juiz. Mas não falo de caso concreto.
A presidente disse em Nova York que não respeita delator. O que acha?
A PF usa todos os meios de produção de prova previstos em lei, nem mais nem menos. Quanto à delação premiada, é um instrumento que tem ajudado muito nas investigações.
O diretor-geral pode telefonar para um superintendente regional que ele nomeou e pedir para aliviar numa investigação?
Ele cai na hora, porque a instituição não aceita. E, se eu fizer uma coisa errada, qualquer policial pode me prender.
Houve tentativas de cooptação de jovens pela internet para atentados durante as Olimpíadas?
A PF tem uma unidade de prevenção ao terrorismo que cresce no mesmo padrão das outras polícias, mas a PF não fala de situações em andamento, que existiram ou não.
O Congresso tenta votar uma lei antiterror para o País. Aprova?
Acho importante para estarmos em sintonia com os demais países, para nos adequarmos a uma situação da atualidade.
Com Conteúdo Estadão.
Fonte: CEARÁ AGORA
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